sábado, 26 de fevereiro de 2011

Já é Carvanal: Para uns, início do ano, para mim, o fim do meu VERÃO


Voltando ao mês anterior, quando meus pés ainda se banhavam na água salgada do litoral e eu podia desfrutar bons momentos de paz e tranquilidade na orla, ou no movimento característico do fim de tarde nas ruas da cidade, reabro uma caixinha de momentos que não sei porque, é impossível permanecer fechada. Uma hora que outra surge um comentário, a falta de um pertence querido, uma fotografia que lembra as férias e aí, está feito. Bem, mesmo que estas férias tenham sido maravilhosas como já descrevi em outro post, elas deixaram saudade. Um pouco dela, fácil de contornar afinal, tem lugares que sempre estarão lá para você. Outra, incoercível, aquela que vai permanecer para todo sempre, a saudade dos objetos. Voltando ao fim de janeiro, bem naquele exato momento da descrição em que início meu post, estavámos, eu e meu namorado em trânsito, loucos e sedentos por aventuras e diversão. Decidimos conhecer uma praia nos arredores de Floripa, que não estava programada em nosso roteiro. Uma decisão repentina, tomada pela vontade de invadir o território do incerto, e ser assaltada pelo motivo da dúvida, e se nós não formos? Vamos perder de conhecer um lugar tão maneiro, não?
Exato. Foi seguindo esta lógica que no penúltimo dia de praia, ancoramos a nossa barca em uma rua sem saída, em frente a uma casa abandonada na praia do Matadeiro, ao lado da praia da Armação no Sul da Ilha. Não sei porque cargas d´água resolvemos estacionar ali tendo tantos outros lugares disponíveis. A resposta mais óbvia é a que este ficava mais próximo da trilha que em breve tomaríamos para chegar na beira da praia. Pois bem, zombamos da nossa inteligência porém, ao deixar dentro do carro TODOS os nossos pertences, que por obra do acaso ou da nossa precipitação, como uma panela borbulhante de água fervente, ficaram justamente ali. Incluindo a mochila dele, com objetos do universo masculino como camisetas, cuecas, bermudas, utensílios para fazer a barba, essas coisas normais. E o pior, a minha mala rosa. Linda, pink, fluorescente, recheada de roupas novas, perfumes, pulseiras, relíquias, brincos, sandálias, livros, cremes, maquiagem ( essa parte dói), roupas novamente, só que dessa vez novas, intocadas e ainda com a etiqueta. Bolsa, aquela bolsa tão adorada, que combinava com a carteira, que levavam o logotípo da GUCCI. Mais a bolsinha de carregar para o mar, outro acessório rosa, pouco chamativo. Pois bem, ficaram todos lá, quietinhos, guardados dentro do carro ( antes fosse a sete chaves). Na saída ainda brincamos, não tem problema, olha essa película, caramba não da pra ver nada dentro mesmo ninguém vai nos assaltar. Vamos lá.
Assim, partimos para o passeio "das trevas". Passamos por uma trilha no meio do mato, com cheiro de humidade, não era pra menos ficava escondida atrás de um rio. Ao sair da trilha, ingressamos em uma caminhada sobre as montanhas, sobe e desce no morro e enfim, chegamos na orla. Era fim de tarde, as famílias já se dispersavam, a fim de retornar para a cidadezinha. Os bares recolhiam as cadeiras pois o tempo sinalizava chuva. E você, deve estar se perguntando mas puta que pariu o que você foi fazer lá criatura. Exatamente, eu também me perguntava durante o caminho. Mas sabe como é, tem coisas que quando se decidem à dois, passam despercebidas. Como a contrariedade da namorada, ou o seu mau humor, por não estar curtindo o passeio, mas respeitar a atitude fofa de seu gentil cavalheiro que resolveu gastar os pneus do seu carro rebaixado nas ruelas que levavam a esta bendita praia, só para mostrar, a bela e romântica paisagem gravada em sua memória. Poxa vida, é de dar dó. Não teria como bater o pé, afinal, a intensão foi tão linda. Bom, prosseguindo.
Na beira da praia, tiramos fotos de motivos, pois naquele momento eu não estava a fim de posar para as fotos ( é realmente o tempo estava mesmo feio), então, parti tirando fotos do gato com cara de malvado que encontramos no caminho, dos morros, dos pombos, do horizonte encontrando o mar em um belo enquadramento digno de um apocalipse em chamas, rosa, laranja, azul, cinza, todas estas cores se misturando e se diluindo uma nas outras. Árvores exóticas, encantadoras que espalhavam suas folhas à medida que o vento contorcia seus galhos lhes sugerindo um balanço suntuoso. Tudo, sem perder os mínimos detalhes, foi documentado. Sentamos na areia, tomamos uma cervejinha para descontrair, e continuamos admirando a natureza se despedir do dia, e dizer que está se pondo mais uma vez. Momento digno de filme, que por ser tão sublime, como todas as coisas sublimes duram pouco, este também durou. Logo acenderam-se as luzinhas do tédio e partimos para um outro lugar.
Última parada: um hostel à beira-mar. Lugar roots que sugeria um estilo hippie, psicodélico, sujo e largado. Típico de um aventureiro que leva em suas costas apenas uma mochila. O lugar ideal para se passar uma noite, conhecer pessoas e contar histórias ao redor de uma fogueira, e depois enfiar na mochila as experiências e voltar pra casa com muita bagagem pra contar. Pois bem, esse espírito aventureiro coroou as nossas férias. Só que eu me dei conta, que não existe hippie playboy, ou desbravador que chega na praia de carro. Nessa lógica nós nos ferramos. Como tudo hoje em dia é uma mistura de estilos, nossa atitude em veraneio veio de encontro com a nossa constante mutação para se enquadrar nos estilos de vida que nos são oferecidos. O conforto é uma prioridade e dele não abrimos mão, ao tempo que inconscientemente tentamos fugir da rotina que se interpela através do comodismo, justamente porque o novo que nos está ao alcance dos dedos é extremamente superficial.
Bem, saindo do albergue, senti uma necessidade tremenda de usar o banheiro. Já estava ficando noite e não havia nenhum WC nas proximidades. Então resolvi que ao chegar no carro procuraria um lugar para tal. Lá estava ele, Punto Sport, amarelo, rebaixado, rodas com aro 17, teto solar, pouco chamativo, só ele e mais ninguém nos esperando na rua. Para nossa surpresa, logo na chegada, ao tentarmos abrir a porta dianteira do caroneiro, algo trancou a chave. Putz, só o que faltava, pensei comigo mesma, foi quando meu namorado teve a infeliz, porém necessária idéia, de abrir a porta traseira. Foi como cair de um prédio de não sei quantos andares e só levar um susto, não sentir nada, apenas seus nervos subindo até as pontas dos cabelos e depois se transformando em berros e sapateados no chão que parecia inquebrantável. Essa foi a reação que tive, ao me deparar com o vazio e não avistar a minha mala rosa. Os minutos seguintes foram como um filme de ação, era um correndo de um lado querendo matar o infeliz que levou nossas coisas, o outro tentando achar rastros dos ladrões, e em seguida da polícia, que obviamente nessas horas não faria nenhuma diferença, mesmo que estivesse presente. Naquela droga de praia, com o perdão da palavra, pois cada vez que faço a releitura da cena fico puta da cara, mais um palavrão, não tinha um policial e pra ajudar, esqueci de contar, estava rolando o show do Ben Harper no Campeche, então todos os milicos, como dizia minha vó, foram lá, assistir o showzinho junto à sociedade civil ( que de civilizada não tem nada), e não deram as caras na tal praia do Matadeiro. Pois bem, e por isso eu digo até hoje que cai numa armação no matadeiro. Seria trágico se não fosse cômico. Ao perceber que a noite já nos abraçava e a raiva ter se esvaido e ficado lá, naquela rua, veio a sensação de pavor e vulnerabilidade, mas também a de união, comoção e apreço, afinal estávamos ali, vivos e unidos. Ao retornar para o Sul da Ilha, nosso destino original, onde deveríamos ter aportado logo quando chegamos à Floripa, a chuva tomava conta da estrada, e de filme de ação, passamos ao terror. Todos os gêneros do cinema fizeram parte daquele dia, nunca vivi tanto em tão pouco tempo. Logo viria a comédia, quando relataríamos o fato na DP.
Ao chegar na praia dos Ingleses, com a roupa do corpo, atordoados muito mais do que cansados, fomos até a delegacia para fazer o boletim de ocorrência. Lá, um senhor semi analfabeto redigia as informações que eu ia passando, só por descargo de consiência, porque aquela ação, não mudaria nada na vida dele, nem na minha. Eu dizia, bolsa NIKE ROSA, e ele n-i-q-u-e né? Essa parte eu gostaria de frizar, pois foi neste momento que me dei novamente por conta de que em nosso país, nós não temos segurança pública. Nós pagamos impostos, e tachas ao governo federal e estas se perdem no turbilhão político que se fecha em torno dos acontecimentos no Palácio do Planalto, e nas contas no exterior, para continuarmos a mercê dos bandidos. Nunca me esqueço de uma frase que minha irmã me disse, quem não tem nada, não tem nada a perder. E é dessa ressalva que os bandidos se munem para conseguir, a mão grande, o que querem. Eu agraço por não ter participado, nem visto o arrombamento do nosso carro. Por não terem colocado uma arma na minha cabeça ou na do meu namorado e levado além das nossas coisas, a nossa paz.
2011, começou estranhamente para mim, e para o mundo. Vemos cenas de guerra em tempo real, na televisão e na internet, tiranos, ditadores, ladrões e matadores de aluguel, todos, figuram nas manchetes nacionais.
Obviamente este ano não será diferente dos outros, assim como os caras que roubaram nossas malas não devem ser mto diferentes de Muhammad Akafi, o ditador que está sendo o centro das revoltas na Líbia. Eu gosto da comparação, pois ela sugere esperança. As coisas poderiam estar piores. A guerra poderia ser aqui, ela existe, e não devemos negá-la, até porque o mundo nunca deixaria isso acontecer, mas nosso pensamento, nossa individualidade e poder de crítica jamais serão banidos. E são estas as razões pelas quais, é possível ter esperança.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

14 dias.


Para algumas pessoas, como eu, as férias simbolizam o começo do ano. Aguardei ansiosamente este momento como se mesmo o final do ano que passou não simbolizasse qualquer coisa. E foi assim, que na metade do mês de janeiro pedi as contas do meu emprego e parti para o litoral, com o pensamento constante de relaxar, inspirar e espirar a brisa marítima que magicamente, invade os pulmões renovando nossas energias e refletindo em nossos pensamentos esta transmutação. Abaixo da chuva ou mesmo sob o guarda-sol, que muito não se fez necessário, pois nestas férias meu corpo foi o meio de transporte e abrigo para as idas e vindas, subindo e descendo morros, encontrando pequenos paraísos banhados por um oceano sem fim, interminável, que tem por mérito representar o infinito que não podemos tocar com as mãos, apenas sentir através de seu movimento, compassado, perfeito, uma maré orquestrada. Nestes dias, pude sentir a paz, encontrar alívio observando as ondas do mar, e vislumbrar terras distantes, fantásticas, concebidas apenas nos lugares mais ocultos da imaginação. E pude contemplar, um ser diante de mim, eu mesma, em carne e osso. Fervendo na areia e derramando gotículas de suor a medida que meus passos alcançavam as alturas das pedras encravadas em montes rochosos, ou mesmo ali, sentada, vislumbrando a imensidão. Os dias se passaram assim, sem que eu percebesse que eram nos momentos em que eu me distanciava do mar, que eu poderia cair novamente na realidade e me banhar em outro oceano o das relações interpessoais. Aquela coisa, estar na casa de praia com a família inteira requer algumas habilidades que não aprendemos contemplando o mar, e nem mesmo a paz que este transmite se estende além da faixa de areia. Por isso digo e repito, que trata-se mesmo de um transe mágico. Voltando à superfície terrena, creio que a nossa densidade por fim se exalte mais do que em qualquer outro lugar. Sentimo-nos emplumados de uma fantasia sem brilhos ou paêtes, pelo contrário, panos leves cobrem nosso corpo, e a pele a cada dia ganha uma tonalidade dourada, amaciada pela estrada, e pelo sol que não perdoa. Não planejamos a próxima refeição, apenas buscamos o aconchego dos lençóis, quando percebemos que nosso corpo não acompanha nossas vontades, não concebendo a hipótese de que mesmo que tenhamos todo o tempo do mundo, ainda assim, não faremos tudo que de fato gostaríamos. Então, acordar pela manhã e se desvincular do retrato habitual da praia em família, é como uma brincadeira que todos admitem gostar. Mesmo nas férias as tensões normais entre pais e filhos existem, no café-da-manhã ou no jantar, sempre surgira um pedido de quem lavará a louça, ou varrerá o chão, ou mesmo um xingamento estridente ora porque não pendurou sua toalha ou mesmo as roupas de banho, porque entraste em casa com os chinelos sujos de areia ou qualquer outra reclamação habitual. Ainda assim, a junção de pessoas que estão aparentemente fora do seu "ninho", e insistem em repetir as mesmas práticas que adotam em suas casas, vale a pena. Quem lê esta descrição até parece que estou criticando os hábitos de outrem, pelo contrário, estou mesmo é reconhecendo de que são necessários, todavia as qualidades do conviver em férias na praia não se exaltariam. Creio que quando saímos de casa, inconscientemente buscamos por dentro da mala tudo que nos é mais estimado como se nunca mais fossemos voltar. Na maioria das vezes não precisamos nem da metade do que é depositado dentro dela, mas o fazemos por medo. Por receio de não estar suficientemente preparados ou munidos para viver o desconhecido, as surpresas e as aventuras que as férias podem revelar. Estou chegando no ápice da minha história, no ponto chave que pretendo discorrer amanhã. A mala, aquela mala cheia de coisas, aonde está?